O domínio das forças conservadoras ou do establishment sobre os principais meios de comunicação tinge as notícias e as leituras que se fazem sobre as eleições parlamentares, salientando as vitórias da direita e atribuindo-lhes um carácter irreversível ou pretendendo limitar as opções de governo a dous partidos, que quixeram de centro-direita e centro-esquerda. Tentam estreitar o campo de jogo, combatendo a pluralidade e reduzindo as possibilidades alternativas de participação nas instituições representativas e de governo.
Sucede isto a respeito das eleições portuguesas e alemãs. Os resultados presentam-se como uma demonstração do avanço conservador, sem ter em conta que, sendo certa a maior influência no continente dos resultados de Alemanha, a vitória da esquerda em Portugal têm um significado contrário. Ganhador o Partido Socialista sobre o conservador Partido Social Democrata, o conjunto da esquerda, com o Bloco de Esquerda e a coalizão de comunistas e verdes, PCP-PEV, ergueu-se com 53,96 % dos votos frente a 39,86 % da direita que compreende o PSD e os mais conservadores do CDS-PP. Ainda em Alemanha a vitoria da provável coalição entre demócrata-cristiãos e liberais, com 48,4 % dos votos não deve esconder que entre o Partido Social Democrata, Os Verdes e A Esquerda, têm com 45,6 % chegam a uma cifra semelhante.
Igual ocorreu recentemente na interpretação das eleições europeias, tomando-se como referência apenas os 265 escanos conseguidos polo Partido Popular e os 184 do Partido Socialista, sem considerar o conjunto da esquerda, incluindo polo tanto os Verdes-Alianza Libre Europeia e a esquerda reunida na coalizão GUE/NGL, que somaba 274 escanos, completando o abano os 84 dos centristas liberais e democratas e os 113 euroescépticos. Nesses mesmos comicios em França, o 27% dos votos da conservadora UMP foram comparados unicamente com o 16% do Partido Socialista, ignorando o 16% dos Verdes-ALE e os reunidos por outros partidos da esquerda. Na mesma linha interpretativa, foi magnificada a leve vantage do Partido Popular do Estado espanhol sobre o PSOE, sem considerar o resto dos elegidos.
É certo que as cifras não dizem todo, e que para além delas é preciso considerar as diferentes experiências estatais e nacionais, as posições políticas e programáticas de cada formação e as tradições a que respondem. Não se pode negar, neste sentido, a deserção de muitas forças da esquerda, que antes protagonistas de avanços sociais e democráticos históricos se acomodaram no capitalismo neoliberal, identificando-se programaticamente com as conservadoras, e que não é inabitual que a esquerda alternativa confunda a loita democrática por transformar a sociedade e o sistema económico com uma crítica sistemática, nostálgica ou exquisita. Tampouco que na direita europeia convivem tendências vengativas que pretendem desmontar elementos fundamentais do estado do benestar com outras respeitosas de conquistas sociais fundamentais en servizos públicos como a educação, o sistema de saude ou as pensões. Em todo o caso, as leituras que hegemonizam a comunicação, incluidas as dos partidos que a monopolizam, acabam por condicionar as expectativas transformadoras e os resultados futuros.
Esta semana, a propósito das eleições em Alemanha e Portugal analisava-se no New York Times o estado das forças políticas em Europa, considerando as mudanças habidas e utilizando, incluso, contra a dura oposição da estadounidense á reforma do sistema de saúde o diferente comportamento das direitas europeias a respeito dos servizos públicos estabelecidos pola esquerda. Falava-se do estado de todas as forças políticas, mas o epígrafe do trabalho era revelador: “Un espectro ronda sobre Europa-O espectro do lento colapso do socialismo”.
Camilo Nogueira Román naceu en Lavadores (Vigo) en 1936. Enxeñeiro industrial e economista, foi eurodeputado polo BNG entre os anos 1999 e 2004.